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Cancioneiro da Serra D’Arga

Cancioneiro da Serra D’Arga

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Aquela menina é minha,
aqueles olhos são meus;
aquele corpo bem feito
era o que eu pedia a Deus.

As moças de Santo Aginha
todas têm um pensamento:
umas amigam-se com os padres,
outras vão para o convento.

Depois de tanto sofrer,
de viver apaixonada,
mas agora que me amas
já vivo mais descansada.

Minha Senhora da Ajuda
ajudai-me a mim primeiro;
sou filho duma viúva,
minha mãe não tem dinheiro.

Nossa Senhora me disse
de cima do seu altar:
filhinha, faz por ser boa,
eu farei por te ajudar.

Quem quiser amar a Deus
não diga que não tem tempo;
pode andar nos seus trabalhos
com Jesus no pensamento.

As cantigas são saudades,
quem canta, saudades tem;
quem canta para esquecer
é certo que lembra alguém.

Adeus que me vou embora,
adeus que me embora vou;
vou embora porque eu quero,
que a mim ninguém me mandou.

Da tua comprida carta
apenas ficou em mim,
meu amor, logo no princípio
as saudades não têm fim.

Ó penas, não venhais juntas,
vinde mais poucas a poucas;
vinde mais devagarinho,
dai passagem umas às outras.

Na minha cama sentada
uma carta tua li;
beijando letra por letra,
chorando, adormeci.

Rapariga dá-te ao mundo,
não queiras morrer donzela,
não queiras levar a honra
lá para debaixo da terra.

A água do rio Lima
foge que desaparece;
quem eu quero, não me quer,
quem me quer, não o merece.

Ainda hoje não comi
senão lágrimas com pão;
são estes os bons almoços
que os meus amores me dão.

Amo e não sou amada,
quero e não sou querida;
falo, e ninguém me responde,
decerto não sou ouvida.

Chamaste ao meu cabelo
dobadoira de dobar,
eu hei-de chamar ao teu
sarilho de ensarilhar.

Antes de te conhecer,
nada de ti se me dava;
sem pensamentos dormia,
sem cuidados acordava.

Chamaste-me cerejinha
diante de tanta gente;
agora fica-me o nome,
cerejinha para sempre.

Desgraçado do loureiro
que nasce ao pé do caminho;
todos passam e todos tiram
do loureiro um raminho.

Eu hei-de amar uma pedra,
deixar o teu coração;
uma pedra não me deixa,
tu deixas-me sem razão.

Eu não sei que mal te fiz,
eu não sei que mal te faço;
foges logo da janela,
quando eu pela rua passo.

Eu não sou como o meu bem,
nem o meu bem como a mim;
o meu bem fala para todos,
eu não posso ser assim.

Meu amor na despedida
nem uma fala me deu;
deitou os olhos ao chão,
ficou a chorar a mais eu.

Se a morte fosse interesseira,
ai, meu Deus, o que seria!
o rico comprava a vida,
só o pobre é que morria.

Tenho uma pena no peito
que me leva à sepultura;
meu amor ser baixo,
e eu não ser da mesma altura.

Tu pensas que és mais do que eu,
não és menos, nem és mais.
Debaixo da terra fria
todos somos iguais.

Lindos olhos têm as trutas,
quem me dera assim os meus;
hei-de ir lavar os meus olhos
onde as trutas lavam os seus.

Recolha por Artur Coutinho (Membro do Centro de Estudos Regionais – Viana do Castelo)

Ver cancioneiro aqui 

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