Jardim da Estrela, Lisboa
Uma árvore robusta, viva, serena.
São precisos dois corpos para a abraçar por completo.
Precisamente à altura do olhar do seu tronco abre-se
recreando uma vagina onde vários animais
teriam podido fundar um lar.
Dentro da vagina da árvore
o guarda do parque construiu uma parede.
Tijolos e cimento ocupam o que antes foi buraco.
A vida selvagem não invadirá a árvore,
graças ao zelo laborioso do vigilante.
O resultado é bizarro:
uma árvore-vagina com a sua parede-hímen.
As fábricas de hímenes existem na China,
vi-o num documentário.
Um hímen falso pode salvar a vida de uma mulher
em vários países do mundo.
É muita antiga a profissão de vigilante
nos bosques de mulheres.
A copa da árvore está florescida,
os ramos tremem com o vento.
Sem dar importância a tijolos e cimento,
a pequena vida animal abre caminho
por entre as fendas da vagina enclausurada.
n Viver tão por dentro, The poets and dragons society, tradução de Nuno Júdice, página 54