NOS idos de 1841, João Baptista da Silva Lopes escrevia na sua Memória Económica do Reino do Algarve que “em todas as idades produziu o Algarve indivíduos beneméritos da pátria, que os julgou dignos de louvor e glória por suas virtudes, ciência e destemido coração. D’alguns, nos tempos da Turdetânia, se lembra a História Literária de Espanha e vários outros autores”[1].
Era assim no antigamente. Agora não consta nada na História Literária de Espanha. Dos indivíduos dedicados à pátria só resta um desses homens valerosos nascidos em Boliqueime. Estamos fartos de retórica oca e coisas mal explicadas. Que a A22 o leve em grande velocidade de volta à Turdetânia e por lá se quede descansado a regar hortaliças e a meter amendoas dentro de figos para resolver os problemas da sua magra reforma.
À sombra da alfarrobeira vendem-se laranjas na N125. Virando à esquerda pode-se lançar âncora em Albufeira a regurgitar de povo escaldado estendido nos areais: fenícios, gregos, romanos e árabes, D. Afonso III e a Ordem de Avis. Depois dos banhos e dos couratos tisnados, virão todos para a estrada e será uma uma algaraviada. Por isso o Infante mandou fazer outra via; disseram-lhe que era um disparate e que investisse na economia do mar; orientou-se para Ceuta, uma despesa que o obrigou a taxar a via e assim sucessivamente; melhor seria ter-se metido na criação da ostra ou, quem sabe, do rodovalho, ou dos figos, ou das amendoas, eu sei lá.
SOBRE O AUTOR: Álvaro Domingues (Melgaço, 1959) é geógrafo e professor na Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, onde também é investigador no CEAU-Centro de Estudos de Arquitectura e Urbanismo. É autor de A Rua da Estrada, Vida no Campo e Volta a Portugal. Colabora com o Correio do Porto desde janeiro de 2015.
Publicado originalmente em 8 de Agosto de 2015
[1] João Baptista da Silva LOPES (1841), Corografia ou Memória Económica, Estatística e Topográfica do Reino do Algarve, Typographia da Academia Real das Sciencias de Lisboa, p.34.