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Coronel Soares de Moura (1923-2011)

Coronel Soares de Moura (1923-2011)

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FALECEU na passada sexta-feira o coronel Soares de Moura. O lousadense, de 87 anos de idade distinguiu-se pela carreira militar e pela escrita. Augusto Cândido Pinto Coelho Soares de Moura nasceu em Lagoas, a 23 de Setembro de 1923. Foi professor de Economia e Inglês no já extinto Colégio Eça de Queirós, em Lousada.

Os últimos anos da vida foram dedicados à agricultura e à investigação histórica.  O homem foi, em 1999, agraciado com a Medalha de Prata de Mérito Municipal pela Câmara de Lousada.

Uma das últimas intervenções deste homem decorreu no Espaço AJE, em Lousada, em Julho de 2010. Soares de Moura falou numa conferência sobre o tema “A minha experiência de aviador”, no âmbito da comemoração do Dia Nacional da Força Aérea.  O Coronel dissertou sobre o seu percurso militar e de todo o fascínio que ainda tem pelos aviões. Do seu percurso fez parte o convite para frequentar um curso de um ano na Royal Air Force, em Inglaterra, que “era considerada uma universidade de topo e onde todos queriam estudar”, referiu na altura.

“Aprendi muito durante esse tempo em que frequentei o curso”, disse o Coronel. Das várias curiosidades contadas, à data, ao público presente, o Coronel referiu que embarcou no primeiro avião da Força Aérea, tendo demorado três dias a chegar de Lisboa a Angola, com escalas na Guiné e em S. Tomé e Príncipe.

O funeral deste lousadense realizou-se no sábado, dia 12, no cemitério de Lodares.

Recordamos a seguir o texto de Marta Ferreira, publicado na edição n.º 9 do VERDADEIRO OLHAR, a 17 de Agosto de 2007, sobre a vida deste lousadense.

Militar de profissão agora na reserva, é um homem sereno e um contador de histórias

Coronel Soares de Moura ingressou na vida militar aos 21 anos na Escola do Exército como Cadete da Força Aérea. Estudou durante dois anos nessa escola e saiu em 1945. Entretanto foi chamado a fazer o tirocínio na Escola de Sintra e por lá ficou um ano. A paragem seguinte foi Espinho, onde permaneceu durante quatro anos e sempre que podia vinha ao Porto para estudar.

Em 1950 apareceram os aviões a jacto e Soares de Moura segue rumo até à Ota, por lá ficou seis anos. Com o aparecimento desses aviões, o Coronel teve a oportunidade de ter sido ” instrutor e o primeiro comandante da Quadrilha de Instrução”, acrescenta.

Profissionalmente sempre quis evoluir e decidiu tirar o curso de Estado Maior em Inglaterra. Mais tarde seguiu-se a América para tirar mais dois cursos, o de Segurança de Voo e de Instrutor de Tiro Aéreo. A 23 de Setembro de 1960 embarca para Angola e aí Soares de Moura ajuda a implantar o dispositivo militar. Segundo ele, “quando começou a guerra eu estava lá mesmo no sítio onde ela rebentou, permaneci durante dois anos e acabei por ser promovido com distinção. Fui para lá Major e regresso a Portugal como Tenente-Coronel apenas com 37 anos”.

O Coronel sempre foi um homem ambicioso e resolve alistar-se para Moçambique como Coronel Chefe do Estado Maior da Força Aérea. Nesse momento “a guerra ainda não tinha começado foi um descanso, mas a verdade se diga, estive seis anos sem um dia de licença. Entretanto a guerra começou e durou quatro anos. Depois decidi regressar a Portugal, mas logo voltei a Moçambique e aí ajudei a implantar a Força Aérea”, disse-nos.

Regressa em definitivo a Portugal para comandar a Base Aérea de Monte Real em Leiria, onde teve a oportunidade de pilotar sempre que quisesse e segundo palavras do próprio “voei mais rápido que o som.  E assim tive três anos muito felizes em Monte Real”.

Recusou o curso para ser General e abandonou a vida militar. Regressou à freguesia de Lodares, concelho de Lousada e de imediato foi convidado a dar aulas no Colégio Eça de Queirós, que já não existe. Mais tarde convidaram-no a fazer serviço militar nos Serviços Sociais das Forças Armadas onde permaneceu durante 14 anos.

A escrita

Depois de abandonar a vida profissional dedica-se em definitivo à escrita. “Comecei a escrever poesia por volta dos meus 16 ou 17 anos. Mas é verdade que como nunca tive uma vida militar muito sossegada e não tinha muito tempo para escrever. Só quando me apo¬sentei é que me pude dedicar intei-ramente à escrita. Um dia resolvi comprar uma secretária nova, comprei papel e disse para mim mesmo que era agora que começava a escrever”, explicou o coronel.

Escreveu vários livros, um romance e outros de investigação histórica, “escrevi histórias de África, ressuscitei uma peça de teatro chamada “Adão e Eva”. O livro que o coronel mais gostou de escrever foi o romance “Segundo Aviso”, e justifica porquê, “foi o primeiro livro que escrevi sobre um episódio da vida real entre duas pessoas, é acima de tudo uma história de guerra”. Soares de Moura escreveu ainda “Lousada Antiga”, “um livro que aborda a história da Vila até 1910”.

A homenagem

Em 1999 a Câmara Municipal de Lousada atribuiu ao Coronel a Medalha de Prata de Mérito Municipal. Soares de Moura fez questão de contar ao VERDADEIRO OLHAR como tudo se passou, “lembro-me muito bem desse episódio e disse ao Sr. Vereador da Cultura que achava que não tinha mérito para ser medalhado. Senti que havia gratidão a mais para mérito a menos, porque apenas escrevi uns livros, mas fiquei de facto muito reconhecido”.

O Coronel sempre foi um apaixonado pela agricultura. O que lhe dava mais pena era “não poder agricultar porque não temos como o fazer. As cooperativas não pagam o vinho, a fruta e acaba por não valer a pena ter animais porque não dá lucro nenhum”, desabafou o Coronel.

in http://www.verdadeiroolhar.pt/

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Coronel Soares de Moura: um adeus comovido

“Comandante, a Pátria agradece para sempre os seus serviços. Adeus!”. No dia 12 de Fevereiro, já no final do ofício fúnebre, a singela homenagem da Liga dos Combatentes, a cujo Núcleo de Penafiel o Coronel Soares de Moura chegou a presidir, teve a profundidade de resumir o sentimento geral perante uma figura ímpar na história de Lousada.

Falecera na manhã de sexta-feira, dia 11, com 87 anos de idade, praticamente na mesma data em que, 165 anos antes, faleceu o seu antepassado, o célebre Brigadeiro Bernardino Coelho Soares Moura, que o Coronel da Lama ajudou a perpetuar em livro e em conferências.

Augusto Cândido Pinto Coelho Soares de Moura, de seu nome completo, nasceu na Casa de Vale do Mesio, em Lagoas, a 23 de Setembro de 1923, filho do Dr. Augusto Pinto Coelho Soares de Moura e de Maria Alice de Castro Neves Pinto Garcez.

Distinguiu-se como piloto da Força Aérea, para além de, na fase mais adiantada da sua vida, se ter dedicado à escrita, à investigação da história local e à docência.

Foi condecorado com as medalhas da Cruz de Guerra (1.ª classe), de Prata de Serviços Distintos com palma (duas), de Mérito Militar (3.ª classe) comemorativa das Forças Armadas no Norte de Angola e comemorativa das expedições das Forças Armadas, em Moçambique. Foi, também, responsável pela companhia de madeiras de Cabinda. Como comandante da Base Aérea de Monte Real, recebeu o Papa Paulo VI, em 1967, quando da visita para os 50 anos das Aparições de Fátima.

Professor e escritor

Já em 1977, como professor no Colégio Eça de Queirós, em Lousada, leccionando Introdução à Economia e Inglês, granjeou o respeito e a estima de colegas e alunos (ver textos nestas páginas). Joaquim Meireles, agora radicado nas Ilhas Canárias como instrutor de condução, não esquece a influência de quem “incentivava muito os alunos”, guardando ainda religiosamente o livro “A População”, de Alfred Sauvy, que recebeu por ser o melhor aluno do período. Nuno Xavier, agora jurista radicado em Angra do Heroísmo, comentou: “Morreu um Mestre. Recto, seguro, sensato, organizado. Lousada está mais pobre”. O Dr. Cláudio Magalhães, na altura professor de História, refere:

“Reconheço no Coronel Soares de Moura o homem íntegro e exemplar e junto-me àqueles que lamentam a sua morte”.

Na sua quinta da Lama, em Lodares, residência senhorial que sempre preservou com esmero, dedicou-se também à agricultura, actividade que muito prezava, tendo sido presidente do então Grémio da Lavoura de Lousada.

No entanto, foi à escrita que se devotou com enorme entusiasmo. Para além de alguns opúsculos sobre o desempenho militar no Negaje – Angola (“As Pontas da História”, edição de autor, 1999) e da actividade da Liga dos Combatentes de Penafiel, publicou, em 1994, o romance “O Segundo Aviso” e a biografia de Bernardino Pinto Coelho Soares de Moura, Brigadeiro dos Reais Exércitos e Barão de Freamunde, em 1998. Já em 2009, editou, em dois volumes “Lousada Antiga”, uma poderosa investigação sobre as origens e construção do território que é hoje o concelho de Lousada.

A sua intervenção cívica estendeu-se à participação nos órgãos dirigentes de várias instituições, do Lions Clube à presidência da Associação Museu-Biblioteca de Lousada.

Um percurso de vida activo e empreendedor, que motivou a Câmara de Lousada à atribuição da Medalha de Prata de Mérito Municipal em 1999.

Casou na igreja de Santo Ildefonso, no Porto, com D. Maria Luísa da Cunha Coelho, sua companheira de sempre, também ela condecorada com a Cruz Oficial da Ordem Militar de Avis por actos de bravura no Negaje, em 1961.

Era pai do Dr. Francisco Soares de Moura, professor universitário, casado com a Drª Lurdes Neto Soares de Moura, e do Dr. Augusto Soares de Moura, já falecido, e avô da jovem Francisca, estudante universitária.

Após ter estado em câmara ardente na capela da Casa da Lama, onde acorreram muitos amigos e admiradores, e das exéquias na igreja de Lodares, presididas pelo pároco Padre Joaquim Maia e pelo Padre António Augusto Múrias, foi a sepultar em jazigo de família no cemitério local.

Quando a porta do jazigo foi encerrada, encerrava-se, também, o percurso de um grande lousadense e de um grande português, que, antes da passagem para a eternidade, já havia firmado um merecido lugar na história. Apesar da sua discrição.

Luís Ângelo Fernandes, in tvs http://pensar-lousada.blogs.sapo.pt/

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Entrevista com Coronel Soares de Moura

Num ambiente que se revelou bastante aconchegante e afável em entrevista com Coronel Soares de Moura, é revelado um outro lado da participação na Guerra do Ultramar, as vivências, experiências e as convicções.

Augusto Soares de Moura é um coronel reformado das Forças Armadas.  Decidiu agarrar a carreira de militar porque a sua família materna estava toda ligada às forças armadas. As condecorações, a espada do avô fascinavam-no.

Antes de ir para o ultramar esteve no Estado Maior da Força Aérea, na avenida da liberdade em Lisboa. Não gostava nada de estar em Lisboa, estava longe da família e quase não havia serviço, o que havia acabava cedo e era apenas papel. O que ele realmente gostava era o trabalho de campo, “gosto de todos mas talvez preferisse mais a parte activa, de comandar aviões”. Foi dos primeiros a voluntariar-se para a guerra, “ se não fui o primeiro, devo ter sido dos primeiros. Há uma coisa que é certa, eu fui no primeiro avião que levou gente para ficar definitivamente em Angola”. Voluntariou-se para a guerra porque segundo o mesmo, “o exército é feito para a guerra”, esta estava a começar e ele entendeu que deveria ir. Nunca se arrependeu de se ter voluntariado até porque aos 43 anos já era Coronel e já podia regressar a sua casa.

Antes de ir para o Ultramar esteve na guerra do Algodão em Malange, onde permaneceu 3 semanas. A guerra do Algodão foi no final de Janeiro, início de Fevereiro e em Março rebentou a guerra colonial.

Esteve no Ultramar quatro anos. Admite que as hierarquias eram privilegiadas pois não ganhavam a mesma coisa e a alimentação era diferente. Os soldados andavam vestidos de uma maneira, os sargentos e os oficias de outra, o tecido das fardas era diferente. “A alimentação também era diferente, havia o chamado rancho, os soldados comiam do rancho. Os sargentos já comiam no que se chamava, messe sargento e os oficiais comiam na messe dos oficiais.”

A verdadeira guerra estourou à sua volta, a 5 km da cidade de Carmona. Pegaram desde logo nos aviões para ver o que se passava, lembra-se de ter visto uma enorme fila de carros numa bomba de gasolina. As pessoas tentavam fugir, havia já muitos mortos e os feridos começavam a chegar. “São imagens que não esquecemos”.

Não teve acompanhamento depois da guerra, diz que nunca sentiu necessidade e que fez a sua vida, fez o que pôde. Foi para lá como Major veio como Coronel, não podia querer mais nada.

O episódio que mais o marcou foi dois dias depois da grande matança. “As pessoas andavam todas a fugir, especialmente as mulheres e havia uns aviões que vinham de Luanda lá à base. Bom, mas os aviões aterravam e levavam aí às 40/50 pessoas para Luanda mas elas chegaram às centenas e então a única solução era a fila. As filas às vezes estavam ali uma hora, duas ou três ou quatro, era quando o avião ia a Luanda descarregava, vinha e as pessoas estavam ali horas e então houve outro apoio. Começamos a ter pena e começamos a fazer umas sopas, ou às vezes um bocado de leite porque havia mães que traziam bebés e a cruz vermelha procurou ajudar. Eu andava por ali, nessa altura não estava a voar e dávamos um pão, sopa e as pessoas claro agarravam e há uma senhora então já vestida de preto, não sei o que significava, lembro-me que estava de preto, era uma senhora relativamente idosa e não quis e disse-lhe “A senhora não quer nada? Olhe que é capaz de estar aqui muito tempo” e ela chorava, chorava e não abria a boca, nem abriu a boca. Os pretos agarraram-na e ela esteve com os pretos toda a noite, só de manhã é que foi libertada e pronto… Coitada da senhora, disse que estava… pronto, foi isto! Nos somos homens e tal, mas os homens também tem coração. E essas coisas são muito bonitas de contar e ouvir mas estar lá. Ela tinha olheiras até cá baixo, chorava, chorava, não queria comer não queria nada!”

Regressou antes da guerra acabar porque todos os lugares de Coronel estavam ocupados e disseram-lhe que regressasse à metrópole, mais ainda ficava mais tempo. Depois de três anos na metrópole disseram-lhe que tinha que ir para o Curso de General e ele disse “não morro sem estar em minha casa” então saiu da Força Aérea. “Fiz a minha parte, acho que bem-feita e chegou.”

in http://burguesinhas.blogs.sapo.pt/

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Coronel Soares de Moura publica “Lousada Antiga”

Tem por título “Lousada Antiga”, distribui-se por dois volumes e é uma poderosa obra de investigação sobre a história local, desde as origens até à Primeira República. O seu autor, Coronel Augusto Soares de Moura, da Casa da Lama (Lodares) cumpriu, assim, um objectivo de há muitos anos.

Ao todo, são mais de 1200 páginas para cumprir o propósito de responder “aos que procuram encontrar com facilidade e terem sempre à mão o que há sobre a História de Lousada”, através de uma apresentação encadeada e de fácil consulta”. O trabalho, que “procurou juntar muito do que tem andado disperso e fragmentado”, encontra-se redigido numa linguagem acessível porque foi sobretudo “para os mais simples” que o autor se propôs escrever, incluindo nessa intenção um Glossário para melhor interpretação de muitas das expressões utilizadas ao longo do texto.

O primeiro tomo é dedicado genericamente ao concelho: Pré-história, Idade Média, circunscrições territoriais e domínios senhoriais, leis antigas, justiça, ensino, comunicações, população, organização territorial eclesiástica, padroados, ordens militares, lendas e tradições e até a controvérsia acerca da criação da Diocese de Meinedo. O segundo volume incide sobre cada uma das 27 freguesias que integravam o concelho em 1910, incorporando, assim, Alentém, extinta e Santa Eulália de Barrosas, e excluindo outras por entretanto passarem para concelhos limítrofes.

A fixação do limite temporal para o estudo em 1910 é justificada pelo autor porque “alguma data teria de ser escolhida” e também porque “o fim de um regime político era um desfecho natural para o livro”, advertindo, no entanto, que “a leitura mostrará que o limite nem sempre foi respeitado”, nomeadamente quando a continuidade se impunha para não interromper o assunto.

O Coronel Soares de Moura, de 85 anos idade, confessou ainda que para a decisão concorreu o receio, durante os últimos anos, de que se procurasse ir mais além poderia não terminar a obra, evocando o pensamento do Padre Luís Cardoso, promotor das Memórias Paroquiais de 1758, segundo o qual “quem quer fazer tudo, não acaba nada”.

O autor manifesta no Preâmbulo que foi norteado pelo princípio de “desenterrar o que já tinha sido escrito sobre Lousada a respeito dos assuntos e dentro do período escolhidos”, apresentando opiniões de vários autores devidamente identificadas”.

O Coronel Soares de Moura manifesta contentamento “se a obra merecer a aceitação e algum apreço dos Lousadenses”, para os quais escreveu, já que, sublinha, outros proveitos não o seduziram.

Trata-se, pois, de um trabalho altamente meritório, de grande rigor e seriedade, a partir do qual muitos outros estudos poderão ser desenvolvidos.

Luís Ângelo Fernandes in http://www.jornaltvs.net/

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